O Xhosa que você ainda não conhece
- Alexandre Chaves
- 13 de nov. de 2017
- 3 min de leitura
O senso comum considera a frase: “o Português é a língua mais difícil do mundo”. Pensando sob um ângulo apropriado, qualquer língua pode ser a mais difícil do mundo, contanto que se afaste de seu tronco lingüístico de origem. Aliás, fica difícil de saber qual a origem do enunciado que inicia o texto... Especula-se que seja uma maneira torta de “valorizar” a Língua Portuguesa. Fato é que dependendo da similaridade lexical, gramatical e principalmente fonológica, os falantes podem se apropriar bem ou mal de outro idioma.
Para um hispano-parlantes, anglófonos e falantes de línguas orientais como o japonês, as nasais da língua portuguesa são quase impossíveis, assim como vice-versa para os sons guturais de outras línguas e as variações de sentido imposta pelas línguas modais, para nós; ou seja, o nível de “dificuldade” de uma língua estará relacionado a origem do seu falante, não existe língua “difícil” intrinsecamente. Sendo assim, seria errado qualificar o Xhosa com língua mais difícil do mundo. Ou a mais complexa. Talvez, sim, seja a língua com fonética mais diversa.
O Xhosa é uma língua com cerca de oito dialetos diferentes falada na África do Sul, por um grupo de quase oito milhões de pessoas. É o segundo idioma mais falado no país depois do Zulu. Origina-se uma miscelânea de outras línguas geograficamente próximas a região atual do Congo e dialetos originários do grupo Banto. Atualmente é ensinada a todas as crianças do ensino fundamental, embora o ensino superior seja ministrado em Inglês.

O que nos chama a atenção e acarreta a impressão de “dificuldade” não é o fato de ser uma língua tonal (que diferencia o sentido da palavra de acordo com volume, duração, abertura e fechamento de vogais e entonação, traço em comum com o mandarin e o cantonês) e sim a articulação de consoantes: muitas terão articulação mais aguda na faringe causando total estranheza ao ouvido tanto ocidental quanto oriental(talvez não no ouvido Tupi), e muitas serão os famosos “clicks” que ouvimos quando alguém fala o Xhosa.
São 15 tipos dessa articulação línguo-alveolal, línguo-palatal e línguo-dental. Fato é que estes sons clicados são empréstimos de outras línguas de origem banta, como o Ju'hoan de Botswana e da Namíbia e o Xóõ, falado também nessa região. As duas línguas, respectivemente, possuem um número muito maior de variedade de “clicks”: 48 e 83.
O que há de comum entre nós e o Xhosa é que a variante brasileira da Língua Portuguesa toma de empréstimo inúmeras características de línguas africanas do grupo Banto. Para ficar no exemplo mais simples, tomemos a pré-nasalisação que fazemos antes de P e B, sumindo com a vogal precedente ao falar com rapidez (empréstimo vira ‘mpréstimo; embora vira ‘mbora). Ou palavras do próprio Banto aportuguesadas, como ‘ncabular, ‘ngabelar, ‘nbalar, ‘npacar, além de ‘mbuta, aportuguesada como “um puta”, cujo sentido original é o adjetivo “grande” (um grande país: ‘mputa país). Não que essa palavras existam no Xhosa, o que existe é a articulação pré-nasal em comum.
Talvez deva-se falar em termos de complexidade e variedade para qualificar uma língua. Todo idioma diverso causa certa estranheza, e essas qualificações são a raiz dos preconceitos lingüísticos, bons ou ruins. Entretanto, toda língua humana é complexa, em especial línguas do continente africano, cujas experimentações de sentido comunicacional se iniciam com o prório processo de criação da linguagem entre os seres humanos.

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